A Espiritualidade bíblica

ARTIGOS - Prof. Pe. Pedro Alberto Kunrath

Setembro é o mês da Bíblia, do Livro sagrado dos cristãos, em comemoração a São Jerônimo, padroeiro principal dos leitores, estudiosos e amantes da Palavra de Deus, cuja memória celebramos no dia 30 de setembro.

A espiritualidade de Jerônimo contém um binômio indissolúvel: a leitura do sagrado Livro e a oração1, pois não está um sem o outro. Repetidas vezes, nos conselhos que dá a seus destinatários, podemos constatar este princípio: primeiro a oração seguida da leitura ou a leitura e após a oração2.A oração contínua consiste em não afastar-se da Bíblia ou dos livros que a comentam; é o conselho que dá a Rústico: “Que da tua mão e dos teus olhos nunca esteja longe algum livro; aprende o saltério de memória, que tua oração não conheça pausa”3. A leitura, informada pela oração, deixa de ser uma rotina de estudo e se converte em prazer. A lectio divina é um encontro de amor para alegrar-se com Cristo. A Palavra não diz somente aquilo que é preciso crer ou fazer, mas cria, ao mesmo tempo, uma relação pessoal com Jesus presente nela; pois, “quando oras, falas ao teu Esposo; quando lês, ele fala a ti”4.

Quando lês, ele (Cristo) fala a ti”, pois as palavras da Bíblia são todas elas palavras de Cristo ao discípulo; é ele quem toma a iniciativa no diálogo, ele diz a primeira palavra. Por isso, não podiam, Jerônimo e os seus, viver sem as palavras de Cristo; e era norma aprender de memória a Bíblia, ao menos, boa parte dela. “Quando oras, tu falas ao teu Esposo”, pois, na lectio divina, não só fala Cristo, também o leitor pode responder e, enfatiza Jerônimo, as únicas palavras que estão à altura de tal diálogo são as palavras das Escrituras. Na própria Bíblia, o Espírito oferece as respostas a Cristo que interpela; e é a prática que o mestre Jerônimo descobre em sua discípula Asela: “Com seu Esposo (Cristo) falava orando ou cantando salmos”5 O mesmo Cristo tem sede de ouvir-nos e quer beber de nosso coração erudito, quer dizer, repleto da abundância da Palavra de Deus: “Oferece-lhe teu peito e bebe de teu coração erudito e descansa”6. Se Cristo fala ao leitor do sagrado Livro com as palavras da Escritura, o leitor não pode senão responder com as mesmas palavras, as únicas aptas para dirigir-se a Deus (Sl 118, 103: “Quão saborosas são para mim vossas palavras, mais doces que o mel à minha boca”; cf. Ct 4, 11).




1. V. GROSSI. Girolamo. In: Il grande libro dei Santi, p. 955: “O diálogo do leitor com as páginas bíblicas se concretiza, pois, em um diálogo com Cristo, porque todas as Escrituras falam dele. A Bíblia, por isso, é o lugar privilegiado do encontro com Cristo, é o grande sacramentum do Salvador; e ignorar as Escrituras é ignorar Cristo”.


2. Cf. Epistula 107, 9: “Orationi lectio, lectioni succedat oratio”.


3. Cf. Epistula 125, 11.


4. Cf. Epistula 22, 25: “Oras, loqueris ad sponsum; legis, ille tibi loquitur”.


5. Cf. Epistula 24, 4.


6. Cf. Epistula 66, 10.





Fonte: Santuário da Paz

Comentários