Especialista fala sobre drama do tráfico humano no Brasil

Irmã Rosita Milese fala sobre a situação do tráfico no País, formas de denúncia, trabalhos realizados, responsabilidade pessoal e conta o que mais a comove
Luciane Marins e Liliane Borges 
CF
Cartaz da Campanha da Fraternidade 2014 (Foto: Divulgação)
O Canção Nova em Foco desta semana conversa com a irmã Rosita Milesi, diretora do Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH), sobre o drama do tráfico humano. O assunto é tema da Campanha da Fraternidade 2014, proposta pela CNBB, “Fraternidade e Tráfico Humano” e lema “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5, 1).
A diretora do Instituto explica que o tráfico humano é mais frequente do que se imagina e que as regiões apontadas pelas pesquisas com maior incidência do tráfico não são as únicas que vivem o problema.
“Situar especificamente uma ou outra região é marcar algo que já se conhece naquela região, e descansar, no sentido de que em outras regiões possa não existir. A medida que vamos avançando em realização de pequisas, percebe-se que em toda região onde se procura aprofundar a temática e identificar as situações, o tráfico humano ocorre”, destaca.
Esse tipo de tráfico acontece em uma ampla diversidade de situações, por isso, irmã Rosita destaca que ainda há muito a se refletir e analisar para perceber realmente qual é sua dimensão. Algumas finalidades do tráfico são mais conhecidas, como o trabalho escravo, exploração sexual, servidão doméstica, criminalidade, extração de órgãos e adoção irregular, mas até mesmo o tráfico para mendicância já foi identificado.
Denúncia
A diretora do Instituto de Migrações e Direitos Humanos orienta que a denúncia desse tipo de tráfico deve ser feita por meio do Disque Denúncia Nacional, ou Disque 100, Ministério Público, Defensoria Pública ou da Polícia, mas também, por meio de Organizações da sociedade civil ou da Igreja que podem ser intermediárias para levar a denúncia aos órgãos competentes.
“O tráfico é comandado por redes fortes, se não houver também uma articulação, um apoio de Instituições, uma denúncia pode trazer consequências prejudiciais para pessoa que o faz isoladamente. É sempre bom valer-se dos caminhos públicos e organizações.”
O que tem sido feito
Dentre várias ações no combate ao tráfico, irmã Rosita destaca duas iniciativas da Igreja. “Tem a criação do grupo de trabalho de enfrentamento ao tráfico de pessoas. Esse grupo de trabalho foi criado há dois anos e vem desenvolvendo várias atividades no País e, agora, a própria Campanha da Fraternidade. Uma grande inciativa da Igreja que está sensibilizando e envolvendo as mais variadas instâncias do País, como estamos percebendo no dia a dia pelas inúmeras demandas que recebemos de estar com as Instituições para debater a temática”.
Muitas Organizações já trabalham nesta área, a religiosa faz questão de recordar algumas como a Comissão Pastoral da Terra, a Rede Um Grito pela Vida, que tem inclusive uma campanha durante a Copa do Mundo: “Jogue a favor da vida, denuncie o tráfico de pessoas”, a Pastoral da mobilidade urbana, ( Pastoral do Refugiado, dos Migrantes, do Turismo, da Estrada, dos Marítimos), Casa Mãe Margarida, Centro de Acolhida de Migrantes, Órgãos públicos e a Pastoral da Mulher Marginalizada.
O que cada pessoa pode fazer?
Três tipos de ações são apontadas por irmã Rosita: a primeira é prevenção. “Por isso o debate, a reflexão, é importante serem reconhecidos os vários tipo de tráfico humano, porque muitas vezes pode estar acontecendo muito próximo de nós, num trabalhador que está sendo explorado, numa empregada doméstica que não tem a mínima liberdade, numa pessoa que aparentemente está bem, porque não pode revelar o drama que vive”.
A segunda ação é atenção às vítimas. “Precisamos avançar no País, porque não é só tirar a pessoa da situação que está, mas dar oportunidade de reinserção social”. E a terceira é lutar por politicas públicas de efetiva atuação contra o tráfico humano.
Testemunho pessoal
Irmã Rosita
Irmã Rosita Milese, Diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos, Irmã Scalabriniana, advogada / Foto:Pastoral dos Migrantes
“Tive oportunidade de acompanhar vários casos. Toda vez que ocorre o tráfico, o drama que a pessoa vive é muito grande, embora muitas vezes esse drama só venha à tona muito tempo depois”, recorda irmã Rosita.
Ela lembra que, no ano passado, em Brasília, foram acompanhados 22 rapazes que passaram pelas situações mais tristes que se possa imaginar.
Sem querer situar um caso específico, a religiosa explica que se comove ao ouvir das pessoas o drama e a impossibilidade a que se sentem reduzidas quando estão nessa circunstância. “É muito difícil entender o que é um domínio total de alguém sobre o outro, quando esse outro não tem força, alternativa, por onde libertar-se”.
Irmã Rosita lembra que no dia em que aqueles rapazes foram entrevistados, ela estava junto com a pesquisadora, conversando com alguns deles. “Perguntava-se: ‘o que vocês pensavam quando estavam nessa situação?’ Eles disseram: ‘só Deus! Naquele momento a gente só pensava que Deus abrisse um caminho’”.
A religiosa emociona-se ao relembrar destas realidades. “Nesse desespero quando a gente se volta para Deus, Deus abre um caminho, aparece alguém, às vezes, a própria polícia, uma pessoa de boa vontade, alguém que encontra um caminho de luz. Fico sempre muito emocionada”.

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